Se você tirasse duas fotos da mesma prateleira de supermercado, uma em 2018 e outra em 2023, e depois as comparasse, encontraria diversas diferenças importantes. O mais óbvio, os preços. Em cinco anos os valores impressos em seus rótulos cresceram. E bastante, perto de 40%, de acordo com o último estudo da OCU.
Há, no entanto, outra mudança igualmente interessante e que pode ter passado despercebida: na segunda foto, a de 2023, provavelmente haverá muito mais produtos de marca branca e menos (muito menos) marcas externas.
O motivo: grandes redes estão expulsando marcas estrangeiras de suas prateleiras. Ou pelo menos essa é a conclusão deixada por vários estudos recentes.
A etiqueta branca, mais forte. É a primeira conclusão que deixa o relatório elaborado pela consultoria Kantar e apresentado pela Promarca, que embora seja parte interessada no debate – representa os fabricantes – deixa algumas ideias valiosas. A sua investigação mostra que em apenas cinco anos, entre 2018 e 2023, os produtos de marca própria aumentaram 13% nos grandes supermercados. Os dados assumem um valor especial quando comparados aos produtos vendidos com a marca do fabricante. Nesse caso a tendência é inversa, com uma queda de 23%.
Ou seja, enquanto hoje nas gôndolas dos supermercados há muito mais produtos com marca própria das redes de distribuição, aqueles identificados com marcas de terceiros têm perdido espaço em uma velocidade notável. Em questão de cinco anos, um em cada cinco produtos deste último tipo desapareceu.
Após analisar seis grandes redes ao longo de cinco anos, o estudo conclui que 3.666 produtos vendidos por fabricantes terceirizados desapareceram de suas prateleiras – passaram de 15.821 para 12.185 – enquanto 1.818 itens de alimentação e higiene foram vendidos diretamente com o selo de revendedor.
Diferenças por cadeias. Embora esta seja a tendência geral entre as grandes redes de supermercados, o estudo mostra que existem diferenças significativas entre elas. A palma da mão na promoção da etiqueta branca vai para a Mercadona. O relatório mostra que nas instalações da empresa de Juan Roig a oferta de marcas de fabricantes foi reduzida em 45% em apenas cinco anos, quase o dobro da média. Além do mais, neste momento a participação do valor da marca branca chega a 74,5%.
A queda também surpreende no Dia, com 42% a menos, ou no Eroski, com 31%. Em Alcampo registou-se 23%, no Carrefour 20% e no Lidl 14%. Essa perda de espaço das marcas fora das redes não demorou a ser transferida para a cesta de compras. Há alguns meses, Kantar já apontava que no ano passado as marcas próprias conseguiram captar cerca de 44% dos gastos dos consumidores.
Não há espaço para escolher. Essa é a reflexão deixada por César Valencoso, da Kantar, na Cadena SER: “Há muitas categorias em que já nem existem marcas de fabricante. : na Mercadona praticamente metade das categorias simplesmente não tem marca. Seus dados mostram que as marcas próprias já representam 65% da oferta de produtos em quase todas as categorias de supermercados.
Apontando para o preço. Não é só que iogurtes, massas, biscoitos, cereais, sucos… com rótulo de distribuidor ocupam cada vez mais espaço nos supermercados; O fato é que as redes também os favorecem em um aspecto fundamental: o preço. Essa é pelo menos mais uma das conclusões deixadas por uma análise feita pela Kantar e The Battle Group e que foca justamente nisso: o efeito da guerra entre marcas próprias e marcas de terceiros nas taxas finais.
Da associação Promarca falam em “discriminação” negativa nas margens que as redes de supermercados aplicam às mercadorias de terceiros.
Até 160% extra. Sua análise, coletada por Cinco diassugere que as cadeias de distribuição penalizem os itens de terceiros e garantam que sejam vendidos a preços entre 5 e 160% superiores aos das marcas próprias.
Sem essas adições aos rótulos finais, os autores do estudo acreditam que o preço desses produtos poderia ser reduzido significativamente. E para lhe mostrar um botão: José Antonio García, um dos responsáveis pela análise, explica que há produtos que entram no supermercado com um preço de venda de 1,79 euros e acabam por ser comercializados por 3,50 euros, o que representa um aumento de 95 euros. %.+
Se nesse caso específico fosse aplicada a mesma margem que é utilizada nas mercadorias de marca branca, a taxa final seria de 2,37 euros. A diferença é considerável e – insiste Ignacio Larracoechea, diretor da Promarca – não se justifica por uma questão de gastos adicionais ou de investimentos na loja. Na sua opinião, responde apenas à “política comercial de competição entre prateleiras”.
Além das prateleiras. Com estes dados em cima da mesa, a associação Promarca não hesita em falar numa “expulsão das marcas das prateleiras” que remonta a 2007, altura em que começaram a observar a tendência. O grupo reúne fabricantes de marcas líderes, por isso é parte interessada no debate, mas mesmo assim os seus reflexos são reveladores. “A grande questão é se a competição é meritocrática ou não. Ou seja, se os resultados e tendências são baseados nos méritos de cada concorrente ou se há alguma concorrência desleal”, comentam.
As implicações vão além dos supermercados e, alertam os autores do estudo, podem também afetar a inovação e o ritmo de lançamento de novos produtos. Do lado oposto, o dos supermercados, lembram que quase 70% das principais indústrias alimentícias do país combinam a produção de marcas próprias com a de mercadorias de marca branca e que os distribuidores jogam com preços e margens para competir.
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