Se o setor agrícola não teve problemas como o aumento dos custos de produção ou a crise climática, um novo problema ameaça o setor na França. Em um ponto que também dói: a produção de queijo.
Queijo francês ameaçado. Alguns dos queijos franceses mais famosos, como o Roquefort ou o Camembert, podem desaparecer, segundo o Centro Nacional de Pesquisa Científica (CNRS). A esperança agora repousa em uma área remota dos Alpes franceses.
Fermentando. O problema não está (como se poderia pensar) na matéria-prima láctea. Afinal, as más colheitas e a seca tornam mais difícil a alimentação de vacas, ovelhas e cabras. O problema está no processo de fermentação e a causa é a perda de biodiversidade.
Há décadas a indústria queijeira vem selecionando microrganismos para a fermentação de queijos dependendo de quais promovem determinadas características no sabor ou aparência do queijo resultante. Essa especialização saiu do controle.
Adeus ao camembert? Dentre todas, a variedade em estado mais crítico é a do Camembert. A razão é que a produção destes queijos se baseia numa única estirpe do fungo. Penicillium camembert. A diversidade genética é, na prática, zero, o que tem degradado a capacidade de gerações sucessivas desta estirpe produzirem esporos.
A situação é um pouco melhor para queijos azuis e brie. Os queijos azuis dependem de duas variedades de Pincel roquefort, um funcionário da Roquefort e outro dos demais. Embora estas estirpes possam reproduzir-se sexualmente, proporcionando alguma variedade genética às estirpes resultantes, a indústria tende a tirar partido da reprodução assexuada destes organismos em favor da homogeneidade.
Adapte-se ou morra. Isto não é o fim dos queijeiros franceses. Mas poderá exigir uma mudança radical, tanto a nível da produção como a nível burocrático. E a padronização não deriva apenas da prática, mas também é regulamentada com o mesmo objetivo de homogeneizar o produto resultante.
“O que precisamos hoje é da diversidade proporcionada pela reprodução sexuada entre indivíduos com genomas diferentes”, explica Tatiana Giraud, pesquisadora do CNRS. Giraud é um dos pesquisadores responsáveis pelo sequenciamento do genoma de outra variedade do gênero P. Roquefort isso poderia ser a chave para a esperança.
Esta variedade é utilizada para fermentar o Termignon azul, uma variedade pouco conhecida de queijo azul produzido nos Alpes franceses. Esta terceira variedade “domesticada” (são conhecidas duas outras variedades desta espécie não adequadas para consumo) poderá introduzir alguma variedade genética em futuras estirpes utilizadas em queijos azuis.
Quando você vê a barba do seu vizinho cortada… Os queijos azuis não são exclusivos da França. Em diferentes regiões espanholas são fermentados queijos que utilizam P. Roquefort, provavelmente os Cabrales sendo os mais populares. Isto pode, portanto, servir de alerta aos produtores deste tipo de queijo (e outros que também possam procurar homogeneidade).
As mudanças no nosso ambiente vão além das alterações climáticas. A perda de biodiversidade é frequentemente percebida como algo que ocorre fora do modo de vida das pessoas. No entanto, a variabilidade natural é fundamental para aspectos tão diversos como a agricultura ou o desenvolvimento de novos medicamentos (e a Penicillium).
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Imagem | Polina Kovaleva