Não é o raio cósmico mais recente a atingir a Terra nem o mais poderoso. Porém, no raio cósmico Amateratsu (como o chamaram os cientistas que o estudaram) existem vários fatores que o tornam objeto de interesse de astrônomos e físicos. A começar pela sua origem: desconhecida.
Muito energético. Em 2021, uma partícula muito energética vinda do espaço sideral, um raio cósmico, atingiu os detectores do experimento Telescope Array, localizado em Utah. É uma das partículas mais energéticas detectadas em sua classe: 224 exaeletronvolts (EeV).
Para referência, o raio cósmico mais energético já detectado, a partícula Oh meu Deus detectado em 1991, tinha 320 EeV. Por outro lado, essas partículas são geralmente classificadas como raios cósmicos de ultra-alta energia (UHECR) quando excedem um EeV.
Isso os coloca em ordens de magnitude acima daquela alcançada pelas partículas em aceleradores. Por exemplo, o Grande Colisor de Hádrons pode atingir 13,6 teraelétron-volts (TeV) de energia após suas melhorias mais recentes. Os 224 EeV desta partícula equivalem a 224.000 TeV.
Emergindo do nada. Mas a característica mais importante deste raio cósmico pode não ser tanto a sua energia, mas o facto de parecer vir do nada. E, ao seguirem o rastro dessa partícula para descobrir sua origem, os pesquisadores se depararam com o nada absoluto, uma região notoriamente vazia do cosmos.
As UHECRs são frequentemente associadas a fenômenos cósmicos altamente energéticos, desde explosões de raios gama até buracos negros e núcleos galácticos ativos. No entanto, os investigadores não conseguiram associar este raio a nenhum destes fenômenos.
Como é possível? A hipótese principal é que a partícula não teve trajetória retilínea. Esses raios podem ser desviados por interações com outras partículas, como campos magnéticos. O problema é que sua alta energia deveria fazer com que essa partícula fosse menos afetada por essas forças que tentam desviá-la.
““Além do modelo padrão.” Para os pesquisadores que vêm analisando a chegada dessa partícula, esse mistério pode abrir as portas para novos conhecimentos sobre a física de partículas. Talvez a partícula possa ter a sua origem num fenómeno físico até então desconhecido (por exemplo, o decaimento da matéria escura), ou possamos estar a lidar com os efeitos de fenômenos desconhecidos pelo modelo padrão.
“Nenhum objeto astronômico promissor que se ajuste à direção de onde o raio cósmico chegou foi identificado, sugerindo a possibilidade de fenômenos astronômicos desconhecidos e uma nova origem física além do modelo padrão”, explicou Toshihiro Fujii, um dos autores do estudo.
Matriz de telescópios. A detecção desta partícula foi realizada através do experimento Matriz de telescópios. Este experimento consiste em um detector composto por 507 estações com pequenos detectores de cintilação espalhados por uma área de 700 quilômetros quadrados nas planícies desérticas do estado de Utah.
Esses dispositivos não detectam a partícula em si, mas sim o rastro que ela deixa ao interagir com as partículas da nossa atmosfera. Isto implica que ainda existem detalhes que não sabemos sobre a própria partícula. Detalhes do estudo foram publicados recentemente na revista Ciência.
Amaterasu. A última das curiosidades desta descoberta nada tem a ver com a física mas sim com o nome com que a equipa, liderada por investigadores japoneses, baptizou esta partícula: Amaterasu.
Amaterasu é a deusa japonesa do Sol, fundamental na criação do Japão de acordo com a mitologia xintoísta. Para os pesquisadores, o mistério desta deusa seria comparável ao da partícula nomeada em sua homenagem.
Em Xataka | O que há de tão especial nos múons para que estejam no centro das atenções de muitos físicos ao redor do planeta?
Imagem | Universidade Metropolitana de Osaka/L-INSIGHT, Universidade de Kyoto/Ryuunosuke Takeshige