Acontece de vez em quando que a pesquisa científica acaba virando uma corrida maluca. Um livro tão emocionante quanto surpreendente e útil. Você não precisa voltar muito para encontrar exemplos. Há apenas alguns meses falamos sobre os esforços do professor Xiulin Ruan para conseguir o branco mais branco possível e na semana passada sobre Ed Currie, embarcando em um desafio não menos surpreendente para conseguir o chili mais quente. Agora podemos acrescentar um novo “corredor” à lista: Sakari Lepikko e os seus colegas da Universidade Aalto, que procuram nem mais nem menos do que a superfície mais eficaz do mundo para repelir a água.
E eles não estão indo mal nesse esforço.
Repelir água? Assim é. Um grupo de pesquisadores da Universidade Aalto, na Finlândia, tem trabalhado em uma superfície capaz de repelir a água com uma eficiência nunca vista antes. Seu objetivo: desenvolver um mecanismo que faça as gotículas deslizarem de forma extraordinariamente eficaz.
Pode parecer estranho, mas as superfícies hidrofóbicas, aquelas equipadas com moléculas que não interagem quimicamente com a água, oferecem uma ampla gama de aplicações práticas. Prova do seu enorme interesse é que a equipa finlandesa, que inclui o estudante de pós-doutoramento Sakari Lepikko e o professor Robin Has, publicou os seus progressos na prestigiada revista Química da Natureza.
O que eles propõem? A Universidade Aalto a considera “a superfície mais repelente à água já criada”. O que Lepikko e o resto da equipe propõem é um método para criar um tipo peculiar de superfície, semelhante a um líquido e dotada de “camadas moleculares muito móveis ligadas covalentemente aos substratos”. Na prática isto traduz-se em superfícies sólidas com uma “qualidade líquida”, capazes de actuar quase como uma camada de lubrificante entre um suporte e a água.
Mas como? Formando uma camada de moléculas semelhante a um líquido em uma superfície de silício, chamadas monocamadas automontadas, ou SAMs. “É a primeira vez que alguém vai diretamente ao nível nanométrico para criar superfícies molecularmente heterogêneas”, afirma Lepikko. Para a pesquisa, ele e seus colegas usaram um reator especial no qual são ajustados aspectos como temperatura ou teor de água. O teste permitiu observar com “detalhes extraordinários” como as camadas crescem.
Temos mais dados? Novo Atlas Vai um pouco mais longe e especifica que graças à nova camada, semelhante a um líquido e que desafia os designs convencionais, a água desliza sobre as superfícies em ângulos 500 vezes mais rasos do que em outros materiais concebidos com propriedades igualmente superhidrofóbicas.
A chave: uma superfície semelhante a líquido (LLS), dotada de camadas de moléculas altamente móveis que agem como fluidos, mas estão ligadas aos substratos para que não escapem. A abordagem é diferente de outras superfícies anteriormente projetadas para repelir a água e que se baseavam na retenção de uma camada de ar ou líquido que torna mais fácil para a água que cai sobre elas formar gotas e eventualmente escorrer.
Que resultado eles obtiveram? Eles descobriram que as superfícies pareciam mais escorregadias quando a cobertura do SAM era baixa ou alta. No primeiro caso, o silício é o componente predominante e no segundo é o SAM, mas ambos os estados compartilham uma peculiaridade: oferecem a superfície “mais homogênea”.
O resultado é interessante porque, reconhece Lepikko, deixa ideias que a priori podem ser marcantes. “É contra-intuitivo que mesmo com baixa cobertura tenha sido obtida uma qualidade escorregadia excepcional”, acrescenta o cientista.
E por que isso acontece? Se o filme SAM for fino, a água forma um filme na superfície que teoricamente aumenta o atrito. Durante o teste, no entanto, a equipe chegou a uma nova conclusão. “Descobrimos, porém, que quando a cobertura é baixa, a água flui livremente entre as moléculas do SAM e desliza pela superfície. Quando esta é alta, a água permanece no topo do SAM e desliza com a mesma facilidade”, esclarece. Sakari Lepikko. Entre os dois estados, o líquido adere ao SAM e adere à superfície.
Porque és importante? Devido ao escopo do estudo. Tanto teórico quanto prático. A Universidade Aalto argumenta que isso “desafia as ideias existentes sobre o atrito entre superfícies sólidas e água” e abre um novo caminho para investigar o deslizamento de gotículas em nível molecular. Para além desse objetivo, a instituição finlandesa destaca também as aplicações que oferece nos mais diversos “campos”, incluindo a ótica, a indústria automóvel ou mesmo a canalização.
“Ao nosso redor, a água está sempre interagindo com superfícies sólidas. Cozinha, transporte, óptica e centenas de outras aplicações são afetadas pela forma como a água adere ou desliza pelas superfícies”, diz ele.
Alguns exemplos? Lepikko cita a transferência de calor em tubos, degelo ou antiembaçamento, entre uma longa lista de campos de aplicação. “Também será útil em microfluídica, em que as gotículas devem mover-se suavemente, e na criação de superfícies autolimpantes”, sublinha o investigador da Universidade de Aalto: “O nosso mecanismo contra-intuitivo é uma nova forma de aumentar a mobilidade das gotículas onde quer que esteja. necessário.”
Ainda há um caminho a percorrer? Sim. E bastante, pelo que a própria universidade explica no comunicado que divulgou com os seus últimos avanços. Embora a instituição nórdica se vanglorie de ter desenvolvido “a superfície mais repelente à água alguma vez criada”, também reconhece que o revestimento SAM ainda é “muito fino”, pelo que se dispersa facilmente após o contacto físico.
A equipa finlandesa também não é a primeira a lançar a corrida para conseguir a superfície mais impermeável. Há uma década, o MIT já trabalhava num mecanismo para conseguir repelentes de água mais eficientes e em 2014 chegou a apresentar o LiquidGlide, uma solução desenhada para impermeabilizar qualquer superfície e material. A própria Universidade Aalto participa de outro estudo que desenvolveu uma superfície superhidrofóbica capaz de passar meses debaixo d’água.
Imagem de capa: Universidade Aalto
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